terça-feira, 28 de julho de 2009

MCJOBS

Depois de muito tempo de jejum voluntário, tive a oportunidade de visitar e comer em uma lanchonete Mc Donald´s. O McChicken, meu preferido de todos os tempos, percebi, tinha mantido a mesma falta de gosto de sempre, com um preço diferente. O ambiente era o mesmo, e apesar de ser um lugar um tanto afastado da minha casa, tive a viva impressão de que já havia comido ali, talvez como alguém que vê um japonês e acha que já o vi antes.

Fato é que nada me impressionou tanto quanto os atendentes do McDonalds. Afinal, o que estou acostumado é com o amadorismo das coisas do Centro-Norte da cidade e do serviço público (especialmente, em nossa amada UFC), em que o modelo de atendimento ainda é o da bodega. Digo bodega, pois, naquela estrutura de serviços, o empregado é ao mesmo tempo dono. Então, ele não tem lá muito medo de ser dispensado. Além do mais, os clientes nunca o deixam por ele ter maltratado esse ou aquele comprador: o boicote de um bodegueiro azedo é antieconomico, é antiestético. Não existe uma equipe de RH, com metas e dinâmicas de grupo para motivar o bodegueiro. Se ele não vai com a sua cara, você que perde.

Se fosse pensar nas regras de ouro do bodegueiro público e privado, estas seriam: 1) você é pago, mas está fazendo um favor; 2) o cliente quase nunca tem razão, e, quando tem, isso não quer dizer nada; 3) repita "eu não posso fazer nada"; 4) se a "bodega" for uma repartição pública, nunca se esforce para solucionar o problema de outra pessoa, sempre tenha um ramal ou setor diferente para apontar; 5) o seu cliente é um ladrão, quer lhe enganar, lhe ludibriar e fazer você trabalhar mais do que devia; 6) você merece coisa melhor que trabalho que tem, está desperdiçando o seu potencial.

Me relacionando, sempre e diariamente, com pessoas que parecem seguir essa filosofia, me deparo, então, novamente, com os McJobs. Não é como os BobsJobs, ou os KalzonesJobs. É um pouco parecido sim: na parede pende o nome e a foto do funcionário do mês, todos estão uniformizados, etc. Mas não é isso. Quando fui para o caixa, o moço que me atendeu falou um texto tão decorado que quase virei as costas, ver se tinha um teleprompter atrás de mim. Pior ainda é que não escutava muito bem, então pedia para que ele repetisse, o que funcionou como se eu houvesse apertado um botão de um boneco falante.

Segui o protocolo à risca: no final, até depositei na caixinha moedas que ajudassem as crianças com câncer. No final, enfim, a recompensa, meu McChicken. Contudo, com uma cobertura diferente: a moça que me entregou a embalagem do hamburguer sorriu um sorriso largo e estranho. Era um sorriso violento, de quem passa 15 minutos no começo de cada jornada de trabalho, vendo se não tem nenhum pedaço de feijão no dente. O slogan "amo muito tudo isso" na dentadura.

Já pensou o que é sorrir por medo? Medo do desemprego. Ecce homo, eis o homem. Ou vocês acham que os bodegueiros de que falei são feitos de material diferente dos McEmpregados? A diferente é que uns estão numa estrutura pré-RH, ou que o RH é simplesmente uma salinha onde tiram o seu emprego, ou botam. Agora, e daqui pra frente, não. A coisa mudou: produtividade, autoconfiança, pro-atividade, mais medo ainda do que antes. Nos países de lingua inglesa, McJobs é uma gíria: significa emprego ruim, mal remunerado, desvalorizado, precário, típico do setor de serviços, do balcão que não é mais da bodega. Pergunto(-me): Será que o bom serviço que queremos, quando um servidor público ou o atendente de uma humilde lojinha nos olha como bosta, é essa McFalsidade, cujo molho especial é o temor da pobreza?